segunda-feira, janeiro 17, 2005


Dominique Lestel. Maravilhas de um pequeno telemóvel, como testemunho de dois dias estimulantes na excelência.

Dominique Lestel falando e Vítor Oliveira Jorge tomando notas para a mais que preciosa tradução.

Fenómeno

A Fenomenologia está cá e para ficar. Quem tiver lido Ingold, Shanks, Thomas, Tilley, verifica como Heidegger, Husserl, Merleau-Ponty estão de moda e abrem caminho à experiência enquanto fenómeno.
O passado está-se a abrir nas portas da percepção.Mas é curioso como o mesmo passado se fecha à percepção de que há já outras galáxias que cintilam.A fenomenologia é também um óptimo pretexto para a abertura dos meios, a transformação dos códigos, a mudança da Matriz.
A experimentação da coisa, é algo que varia segundo a mediação da mesma.

Este foi um fim-de-semana de fenómenos no Porto.
Em primeiro lugar Dominique Lestel. Foram muitos os que perderam a estadia deste pensador (no sentido total).
Veio-nos abrir a porta à compreensão do artefacto, de um outro modo, como se de um organismo se tratasse.
Depois pela antestreia do Documentário “O sítio de Castelo Velho” de Catarina Alves Costa.
A Catarina é um fenómeno que transmite os outros aos outros, mediada por uma câmara.
Restringi-la a um produto seria atá-la de um modo catastrófico.
Com o seu trabalho ela demonstra-nos que o meio não se restringe a uma só voz (texto) e que a arte é também ciência.
Pelo meio houve o lançamento de mais uma obra: “Conservar para Quê?” – edição DCTP FLUP / CEAUCP, no seio de uma instalação (“Chronos”) de Danilo Pavone.
Quem assistiu a tudo, pode bem aproveitar e reflectir sobre a castração-escrita. É que depois de ver a profusão da experiência pela multiplicidade de meios, vemos que este é ainda um mundo pobre para os que ainda não se libertaram da Galáxia Gutenberg.
E não adianta arrastar com a dicotomia arte/ciência. Fenomenológicamente é a abertura da experiência. Pragmaticamente: Abram os Olhos!!!!!!!!!!!!!!!!!

quarta-feira, janeiro 12, 2005

O 12 de Janeiro

O 12 de janeiro é o dia do meu aniversário. É assim que vem marcado no calendário GundiSalvus.
É um dia que vai oscilando através dos anos.
Já foi a alegria das prendas, de um dia de Natal em Janeiro ou a depressão do balanço de mais um ano que passou desde que nasci.
Este 12 de janeiro marca o cruzar de uma barreira. Passei a ter 30 anos.
Não me consigo imaginar trintão.
Já devia ter suspeitado dos sinais. Nas escavações as novas levas de voluntários começaram cada vez mais a tratar-me por você e a terem dificuldade em tratar-me por tu.Era o sinal do distanciamento da idade.
Sempre quis ser mais velho. Quando me perguntavam o que é que eu queria ser quando fosse grande punha-me a imaginar sobretudo o que seria ser mais velho.Via os meus pais e imaginava o que era ter a idade deles.
Curiosamente nunca quis verdadeiramente ser nada. Só mesmo saber como seriam aqueles reencontros de liceus, os casamentos, os filhos...
Cada vez estou mais velho e cada vez me lembro mais do que era ser novo. Com nostalgia, mas sem um desejo premente de parar o tempo. Gosto de ser Velho. De apelido e de forma de vida.
Ser Velho é viver na responsabilidade de ser.
Enfim...é bom que atrás dos tempos venham tempos. Melhores se possivel.

terça-feira, janeiro 11, 2005

O Arqueólogo de campo

Sempre me pareceu que na área à qual me dedico existe uma paixão secreta, imaginária por uma figura mítica: o Arqueólogo de campo.
Trata-se de alguém que reúne um pouco de vários mitos.
Imaginariamente desloca-se por vastidões de terreno, procurando esses restos míticos de um passado mais ou menos distante.
É o contacto com o campo, com a realidade, fora do espaço urbano.
Alguém que avança coberto de pó, só ou em equipa, com o sorriso aberto de quem contacta diariamente com a natureza.
É tão mítica a figura que penso que só poderia ser igualável ao famoso imaginário do arqueólogo-busca-tesouros, do qual o Indiana Jones se tornou um ícone.
Todos nós (inclusive eu em parte) temos um apreço especial por esta figura. É como se fosse a encarnação viva do desejo de todos: viver completamente a “full time” a profissão de arqueólogo.
Aqueles que detêm esse luxo acabam por mirar com certo desdém para os “Académicos”. Pobres diabos, que escavam quinze dias a um mês, por ano e que depois se debruçam sobre o resultado dessa campanha durante o resto do tempo que lhes sobra.
Estes graças à vaga teórica que assolou o campo da arqueologia, são vistos como uma espécie que habita num limbo. Desse lugar vão ditando uns escritos cá para baixo, os quais vão sendo consumidos pela ralé mortal.
A relação entre o arqueólogo de campo e o académico é a projecção imaginária de uma luta de classes, entre o proletário e o patrão.
Nas mais variadas conferências a que assisto, bem como noutras actividades públicas do meio, lá vamos assistindo a este confronto.
Ele reflecte a nossa pobreza, firmada na dialéctica marxista, dualista que ainda domina o nosso modo de pensar.
Trata-se no fundo de mais uma divisão criada num seio de uma sociedade classicista, em que cada um necessita ardentemente de justificar o seu papel.
Serve como um modelo pelo qual vamos trabalhando, acreditando mais na “prova material” ou no “trabalho teórico”.
Dá que pensar sobre o que é trabalhar em arqueologia. É assim tão diferente???


Uma amizade com um relógio avião

Era um relógio que se transformava em avião. Tinha um botão no qual se carregava e o objecto ganhava asas. Saia em promoção com uns gelados.
Foi através dele que começou uma bela amizade.
O Hugo tinha nascido a 11.1.1975. Era um dia mais velho que eu portanto. Por coincidência o início do seu nome começava com a letra do alfabeto que se segue à minha. Foi por essa mesma razão que acabámos juntos naquela carteira.
O avião foi o pretexto para eu puxar conversa com aquele que seria o meu colega de carteira, naquele 7ºH.
Lembro-me perfeitamente da cara do Hugo, enquanto eu indagava sobre as propriedades do relógio-avião. Perguntava-se lá por dentro, se este tipo que está aqui ao lado, não lhe quereria já roubar o precioso objecto.
Era uma turma difícil num ambiente novo: o liceu da Figueira da Foz.
Graças à amizade conseguimos superar aquele período que parecia tão difícil.
Avançámos pela adolescência, numa amizade pela qual atravessaram muitos amigos. Amigos que se tornaram comuns a um e a outro. Uma fusão de amizades que duraram muito tempo.
A Universidade separou-nos para sítios diferentes. Já há muito que não éramos da mesma turma, mas permanecemos sempre os melhores amigos.
Fizemos a já tradicional viagem de finalistas a Benidorme. Passámos por diversas coisas juntos. A melhor parte eram sem dúvidas as raparigas. O objecto do nosso desejo por excelência.
Perdemo-nos quase o rasto a seguir à Faculdade. Casámo-nos e no meu caso Divorciámo-nos. Ele tem já filhos.
Já não nos vemos há muito, mas o dia 11 de Janeiro está sempre no meu calendário como o dia do Hugo.
Parabéns Hugo, onde quer que estejas.

sábado, janeiro 08, 2005

Plágio por Earl Babbie

Plágio

por

Earl Babbie

Plágio é a apresentação de palavras ou ideias de outrem como nossas.


Tornar um texto que na realidade foi escrito pelo teu colega de quarto e dizer “Fui eu que escrevi isto”, é um claro exemplo de Plágio. O mesmo é verdade quando se compram textos já “Pré-fabricados”.

O mais leve castigo para plágio deste tipo, seria a atribuição de um zero como nota para esse texto. Outro castigo seria não ter aproveitamento nessa disciplina, ou mesmo ser expulso da escola Como podes ver trata-se um crime bastante grave.

O plágio é errado por várias razões.

Primeiro que tudo é mentir. Se te foi pedido que escrevesses qualquer coisa como prova de que pesquisastes vários materiais e tu estás a tomá-los de outra pessoa, isso é mentir (e roubar). È o mesmo do que outro fazer um exame em teu nome.

Segundo, é um insulto para os teus colegas. Quando plagias, tal como quando fazes batota num exame, tratas de maneira injusta aqueles que jogaram pelas regras. Buscas uma vantagem injusta sobre eles, e inevitavelmente, vais ver-te a olhar de uma outra forma, para aqueles que se deram todo o seu tempo e energia para a tarefa em que tu fizeste batota.

Terceiro, quando utilizas palavras e ideias das outras pessoas sem ter a sua permissão, isso é roubo. Seria errado esgueirares-te para uma fábrica e roubar os produtos manufacturados durante esse dia, e na academia, palavras, ideias, pinturas, composições, esculturas, invenções e outras criações, são aquilo que é produzido. É errado roubar e então reclamar o produto como próprio.

O plágio é um assunto muito importante no mundo académico.

Existem muitas formas de plágio, algumas menos flagrantes que os exemplos dados no início deste texto. Contudo, deves perceber e evitar todas as formas de plágio. Apresentar as ideias e palavras de outrem como tuas – de qualquer forma— constitui plágio. Algumas formas de plágio são provavelmente não tão óbvias para ti, como tal, vamos explicá-las em detalhe. Pensamos que muito do plágio é inadvertido ou provém do desconhecimento. Nós queremos ajudar-te a evitar este embaraço potencial.

Vamos imaginar que te é dada a tarefa de fazeres uma recensão sobre o livro de Theodore M. Porter, Trust in Numbers: The Pursuit of Objectivity in Science and Public Life (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1995). Ao preparares-te para escrever o teu texto, deparas-te com uma outra recensão desse livro por Lisa R. Staffen, publicado na Contemporary Sociology (March, 1996, Vol. 25, No., 2, pp. 154-156).

Essa recensão começa com o seguinte:

Tornou-se moda rejeitar a noção de objectividade absoluta com base em que é simplesmente inatingível ou, mesmo se atingível, é indesejável.

Este começo de Staffen é bom enquanto prosa activa. Vamos imaginar que gostas da maneira como está escrito. Mais importante, vamos imaginar que o teu professor iria gostar muito dele. Tu decides começar da seguinte forma (O comentário original está escrito a vermelho)

Plágio: Eu penso que se tornou moda rejeitar a noção de objectividade absoluta com base em que é simplesmente inatingível.

Isto seria um caso claro de plágio e como tal seria inaceitável.

Ao acrescentares “Eu acho” no início deste-lhe um belo toque pessoal, mas isso não muda nada. Vamos dizer a verdade: Provavelmente não passas-te muito horas acordado agonizado pela “noção de objectividade absoluta”, muito menos preocupado acerca de que se outros rejeitariam ou aceitariam essa noção com paixão.

Plágio: Eu penso que se tornou elegante rejeitar a ideia de objectividade absoluta com base em que esta não pode ser alcançada.

Mesmo editando esta passagem tal como está escrito em cima, seria plágio. Embora tenhas alterado algumas destas palavras por outras --“elegante”, “ideia”, “noção”—a ideia expressa, junto com muitas outras frases, foi retirada por outra pessoa, sem que se desse conhecimento desse facto.

Deixando de for o “Eu penso”, não absolve em nada o pecado. Qualquer coisa que escrevas num texto, a menos que indiques o contrário, é assumido como sendo o teu pensamento original. É óptimo teres ideias originais, aliás, isso é até encorajado. Ficamos felizes quando as tuas ideias e opiniões são baseadas em argumentos e pensamentos teus, mais do que no rumor ou na crença de que os teus professores são de algum modo perversamente entusiasmados por palrares as ideias que eles já sabem (Embora por vezes pareça assim.)

Plágio: Muitas pessoas hoje rejeitaram a ideia de que exista tal coisa como a verdade absoluta umas vez que elas não acreditam de que tal possa ser alcançado

Mesmo através de restarem apenas algumas poucas palavras do texto original, a ideia expressa foi retirada de outrem e foi oferecida como sendo tua. Mesmo que encontrasses um modo de expressa as ideias de Staffen sem utilizares nenhumas das suas palavras originais, não deixava de ser plágio. Desculpa. Continuam a ser as palavras e/ou ideias de outra pessoa e deves-lhe dar crédito por isso.

Usar as palavras e ideias de outrem e vais para a cadeia. Bom, não é assim tão mau, mas os académicos não têm nenhum senso de humor quando se está a fazer batota. O que aconteceria se algum aluno entregasse um trabalho que foi escrito por um amigo na mesma cadeira no semestre passado. Se ele tivesse apenas apagado o nome do seu amigo e teria escrito por cima o seu – e conseguia-se ler o original nas costas da página. Ele teria de fazer a cadeira outra vez.

Não existe nada de errado em apresentar as ideias e palavras de outra pessoa, que foram publicadas num trabalho escolar ou num texto. De facto, qualquer campo de pensamento envolve que as pessoas leiam a ideias uns dos outros, aprendendo e construindo-se a partir dessas mesmas ideias. A chave para fazer isto no modo devido reside em dar conhecimento e na citação

Quando utilizamos ideias e palavras de outrem, nós devemos dar conhecimento de que o estamos a fazer, e ao fazê-lo nós devemos dar aos nossos leitores a referência bibliográfica por inteiro, de modo a que eles possam ler e confrontar o original.

Talvez seja útil folhear alguns artigos de revistas académicas. Ser-te-ia claro que os académicos acham bem usar as palavras e ideais de outras pessoas. É apenas importante usá-las de um modo apropriado. Usá-las como recursos para construir a tua própria contribuição para o debate de ideias em curso.

Não faz mal que queiras esculpir um elefante. Não há problema. Pega num bloco de granito, retira tudo aquilo no bloco não se parece com o elefante. Agora não pretendas parecer de que foste tu que inventaste o granito (Se tal for o caso aqui vão as nossas desculpas)

Aqui vai um exemplo de como podes incluir o comentário de Staffen no teu trabalho, com a entrada bibliográfica no final do texto.

Uso correcto: Tal como Staffen (1996:154) começa a sua recensão do livro de Porter sugerindo de que “Tornou-se moda rejeitar a noção de objectividade absoluta com base em que é simplesmente inatingível ou, mesmo se atingível, é indesejável.”

Isto dá a informação para o leitor, e deve ser acompanhado pela citação bibliográfica apropriada no final do teu trabalho:

Bibliografia: Lisa R. Staffen, "Featured Essays," Contemporary Sociology , March, 1996, Vol. 25, No., 2, pp. 154-156.

Aqui vão outros modos aceitáveis de utilizar a passagem de Staffen. Cada uma deve ser acompanhada pela entrada bibliográfica no final do artigo.

Uso correcto: Na sua recensão ao livro de Porter, Lisa Staffen (1996:154) diz que é hoje comum rejeitar a ideias de objectividade absoluta “simplesmente porque é inatingível ou se atingível, é indesejável."

Uso correcto: De acordo com Lisa Staffen (1996:154), tornou-se elegante rejeitar a ideia de objectividade absoluta no seu conjunto.

Em suma, é bastante aceitável – e até desejável— incluir as ideias de outros no teu trabalho. Isto pode ser sinal de uma boa formação, bem como assegura ao teu professor de que tu realmente leste a bibliografia proposta. (Gostaríamos de pensar que leste pelo menos alguma parte dela).

Contudo, é importante de que tu dês conhecimento e cites correctamente os materiais. A chave é que o teu leitor saiba o que estás a utilizar e possa confrontar os materiais originais.

A propósito se o teu professor te pedir que escrevas um relatório sobre plágio, não copies o texto acima, a não ser de que o cites devidamente…


In Babbie, Earl; 1998; “Plagiarism”; http://www.csubak.edu/ssric/Modules/Other/plagiarism.htm

sexta-feira, janeiro 07, 2005

CAA em Acção

Pois é amigos o CAA 2005 está em acção.
Para quem não conhece ainda, o CAA (Computer Applications in Archaeology) é a maior conferência em aplicações informáticas e quantitativas à arqueologia.
E não é que este ano se vai realizar em Portugal!!!!! Sim a conferência internacional !!!!
O objectivo é sacudir aqui com o burgo e ver se damos um salto não só epistemológico mas também tecnológico e metodológico.
Parece incrível mas até agora só temos uma comunicação portuguesa. A proeza deve-se à empresa Hipocausto.
Então malta ?! Onde é que estão esses exemplos de ponta? Onde é que param esses projectos empreendedores e inovadores em Arqueologia??
A conferência tem um espírito porreiro, aberto, onde todos os que chegam de novo são bem acolhidos. É sem dúvida uma lufada de ar fresco.
Se poderem publicitem esta causa, por todos os meios.
Está na hora de acordar!!!!
O lema da conferência de Tomar vai ser: “The world is in your eyes”. Estará????

História

Já agora e para que vejam de que vai isto, conto-vos como conheci este meio.
Em 1997 enquanto estava em Madrid com uma bolsa Erasmus, descobri na Biblioteca do Museu Nacional, um livro vermelho da BAR cujo o titulo era “Proceedings of the Computer Applications in Archaeology Conference”.
Sempre fui um desses tipos que quase nasceu agarrado ao teclado (ai meu ZX81).
Pois bem, sentei-me e abri aquilo. Foi como se tivesse aberto a arca do tesouro, com o brilho das páginas a reflectirem na cara.
Era tudo aquilo que uma pessoa podia imaginar em termos de aliar computadores, electrónica e arqueologia. O campo era tão vasto.
Depressa descobri os outros volumes da conferência. Foi…
Logo decidi que tinha de ir lá. Tinha de ir ver aquilo. E não é que no ano seguinte ia ser aqui mesmo ao lado em Barcelona!!
Foi em 1998. Lá fomos. A proeza deve-se essencialmente à Alexandra que conseguiu um dinheirito para financiar a excursão. 14 horas de autocarro depois e eis nos em Barcelona.
Não é que estavam lá mais portugueses. O João Muralha (que tínhamos conhecido naquele Verão na nossa 1ª campanha de Castelo Velho) e a Mila Simões de Abreu (que tínhamos conhecido exactamente nas mesmas circunstâncias).
Foi melhor do que alguma vez pensámos. Tão bom que repetimos a dose em 2000 em Ljubljana (Eslovénia). Dessa vez já levávamos não uma mas duas comunicações (o trabalho de seminário da Alexandra e o Templo de São Cucufate em 3D). Correu muito bem, apesar daqui dos putos terem metido a pata na poça e terem trocado as sessões (estão a imaginar a cara da malta de 3D quando viram uns bonequinhosque nós dizíamos serem agentes semi-inteligentes lol). A Alexandra chegou a ser nomeada para melhor comunicação e choveram convites para irmos fazer o Doutoramento lá fora.
Que mais se pode dizer de uma malta tão porreira, que nos recebeu tão bem. E entretanto lá temos continuado a ir. E a conhecer mais portugueses que vão desenvolvendo trabalho nesta área (Olá Alexandrino).
A história continua agora com o realizar do sonho de um dia podermos organizar este acontecimento fantástico, cá em Portugal.

quinta-feira, janeiro 06, 2005

Opinativo e Perguntador

Se há uma coisa que me tem vindo a dar que pensar é sobre a atitude que uma pessoa pode ter quando está perante um acontecimento científico público (tipo mesa-redonda, conferência, congresso, etc).
Uma das coisas que mais impressão me faz, sempre que acontece um destes acontecimento é a participação.
Geralmente, após a apresentação do perito (pessoa que se dirige à audiência e que se pressupõe que detenha o poder que lhe advem, por sua vez, do conhecimento) à espaço para o debate ou para que se levantem questões. E é então que passa a reinar um silêncio confrangedor, de acordo com aquilo que parece ser uma regra tácita.
Todos ficam mudos. Porquê? O que leva a que as pessoas não perguntem não intervenham?
Sempre achei que tal atitude era uma falta de respeito perante o orador. Demonstrava falta de interesse que poderia derivar de inumeras razões, mas que terminava em alguém sozinho "em palco", um pouco estupefacto.
Reparei que muitos dos que me estavam próximos tinham esta atitude. Resolvi fazer uma pequena sondagem e verifiquei que as principais razões eram:
- não dominar a matéria
- ser-se timido
- não haver nada a acrescentar
Do mesmo modo a opinião dominante desta amostra sobre as pessoas que levantavam questões no final era de que:
- queriam protagonismo
Parece-me que todos estes pontos são passiveis de ser rebatidos, nomeadamente porque sou um crente nas vantagens do Dialogo sobre o Monologo.
Perguntar ajuda a que se compreenda melhor o que foi exposto. É uma oportunidade única de interagir com alguém que acabou de investir sobre um tema. Se alguém acabou de ouvir uma exposição e acha que não domina a matéria, bem o melhor é tentar ver em que coordenadas se situa, tentar tirar a cartografia à coisa, com o pouco que se sabe.
É um pouco estranho que num público de arqueologia ou pré-história nínguem domine a matéria sobre o que é o Neolítico ou outras questões que vão à base.
Por outro lado se alguém ouviu alguém e isso não lhe suscitou dúvidas, interrogações ou ideias, é porque ou provou taxativamente o que pensava ou então, não entendeu nada de nada.
Pior ainda é a atitude da acusação de protagonismo. Numa sociedade classista como é a portuguesa, esta acusação é uma arma arremessada contra todo aqueles que se mexa. É a imposição do estilo "burro calado...." e "pouqinho a pouquinho se tece o caladinho" (expressão que acabei de inventar mas que serve para o propósito).
Sempre me senti só nos debates cá no burgo. Sempre fui o chato de turno, que não deixava a coisa acabar mais cedo e que se punha para lá a perguntar.
Tive sorte em poder participar em conferências no exterior e de ter estado durante um ano a estudar lá fora. Parecia o mundo virado do avesso.
Muitas vezes pergunto-me como seria se este virus da não interrogação chegasse ao jornalismo. Já se imaginou o que era a Conferência de imprensa em que os jornalistas se acotevelavam, acanhados e dizendo em voz baixa uns para os outros "Pergunta tu", "Não, não. Pergunta tu." perante um ministtro que já sorria por sair sem que nínguem o questionasse sobrte o escandalo do momento.
Sempre que vejo conferências de imprensa, entrevistas e mesmo as Flash Interview, admiro o modo como as perguntas vão sendo feitas, ficando satisfgeito quando o jornalista vai lá ao sumo e pergunta aquilo mesmo que nós estavamos a pensar.
Deveremos começar a trazer jornalistas profissionais para que tal aconteça. É que podem dizer que eles não fizeram uma licenciatura na área em questão, mas sempre, sempre, fazem perguntas, questionam-se, interrogam.
Será que em Jornalismo há a cadeira de Entrevista 1 ou Conferências de Imprensa I e II?
Mas as coisas não são estáticas e hoje já me sinto mais acompanhado. Devo-o ao actual 1º ano de Arqueologia do Porto.
Nas últimas iniciativas, lá tem estado aquela malta, a questionar, a perguntar, a ajudar na tarefa de construir conhecimento. E sim são alunos do 1º ano!!!
É assim mesmo malta! Força! Não desistam!
Quanto ao discurso fascista-totalitário da não opinião, não reacção, não questionamento, só tenho a dizer que o conhecimento constrói-se de opiniões que vão amadurecendo.
Uma pessoa que nunca teve uma opinião na vida, dificilmente irá mudar, e se nunca a demonstrou e a guardou com avareza para si, então é como se não a tivesse. Faz lembrar aquela personagem do Eça (O Pacheco) que era tão avara de ideias....
Maleficio viria era se a opinião fosse obstáculo à construção de saber, se não desse espaço a outros. Não me parece que seja isso que aconteça aqui.
E se for disparate... quem nunca disse um que atire a primeira pedra.

Leroi Gourhan

Devido à cadeira de Materiais Arqueológicos e Etnográficos, redescobri Leroi Gourhan.
A minha primeira aproximação ao autor deveu-se a Domingos Cruz, que foi meu professor de Origens do Homem em Coimbra.
"Os caçadores da Pré-história" e "Religiões da Pré-história" foram duas das primeiras obras que adquiri enquanto estudante.
Não era fácil. O 1º ano foi-me difícil do ponto de vista económico, por razões familiares diversas.
Comprar livros era uma matéria de escolha bem ponderada. Começava por requisitar na Biblioteca e só depois, se convenciam de facto, é que comprava no máximo 5 livros por ano, que eram parte de uma seriação de todas as cadeiras.
Foi Leroi-Gourhan que me lançou para o espirito crítico em arqueologia. Aliás foi depois de ter lido "As religiões da Pré-história" que fiz o meu primeiro trabalho universitário "O Homem de Neanderthal não era canibal" (o titulo poderia ter sido bem melhor, mas enfim).
Foi aí que descobri o início da citação e da recensão crítca. Da leitura de artigos científicos e de outras obras. Comparar, estudar, enfim toda a panóplia que faz parte o estudo.
Hoje Leroi-Gourhan é um autor diferente para mim. Conheço-lhe o jeito da escrita, bem como algumas ideias básicas (Tendência, facto). O seu intuito maior era magnífico. Passava por um estudo e recolha global, de tudo o que havia sido feito pelo Homem. Não era a Cultura Material (tão aproveitada por vezes para definir outros circulos). Era mais do que isso. Era o estudo do Homem através dos seus vestígios. Há aqui uma diferença que pode escapar aos menos avisados.
Alguém que realizou fichas e desenhos dos diferentes instrumentos e engenhos com que se deparou. Que tentou criar um sistema de análise, Pai das cadeias operatórias. Que esquematizou o Gesto (Percussão arremessada obliqua...)
Leroi-Gourhan lembra-me afinal do que é isto que fazemos. Porque não escapamos ao que somos: ocidentais modernos. Se somos arqueólogos, lamento mas enquadramo-nos numa profissão que nasce deste acidente. Tudo o que façamos a seguir é reflexo disto mesmo.
Isto no entanto não nos prende. Conscientes podemo-nos libertar para fazer outras coisas. Contudo é bom que de vez em quanto olhemos para o que está antes.
Perante o trabalho deste investigador, nunca vi ninguém que negasse a sua importância. É extraordinário. No entanto no meio da discussão proveniente da influência anglo-saxónica Leroi-Gourhan deixou de existir. Porquê?